Deuxieme


sexta-feira, abril 20, 2007

GUIA PSICANALÍTICO DA HISTÓRIA DO CINEMA







Será certamente o documentário sensação e uma marca a não esquecer nesta edição do IndieLisboa 2007. Chama-se The Pervert's Guide to Cinema (de Sophie Fiennes, Grã- Bretanha / Aústria / Holanda, 2006), onde o ensaísta Slavoj Zizek (1949-…) constroi um guia pessoal pela história do cinema. Aplicando como base o pensamento lacaniano e freudiano, no inicio sobre os filmes de Alfred Hitchcock e David Lynch -— dos quais explica praticamente quase toda a obra — Zizek torna os dois cineastas protagonistas de uma história que até parece comum e de proximidade: o cinema como forma artística mais perversa de todas, isto é não nos dá o que deseja-mos, mas diz-nos como desejá-lo. Distantes na história do cinema os dois cineastas tornam-se assim nos protagonistas principais de um percurso que aborda ainda as obras dalguma forma psicológicas como as de Andrey Tarkovsky, Charlie Chaplin, Ingmar Bergman, Michael Haneke, Francis Ford Coppola e os Irmão Marx, entre outros.

Slavoj Zizek é um curioso filósofo, psicanalista, e investigador esloveno, nascido em 1949, que está efectivamente na moda, aliás como Humberto Eco, esteve na década de 80, pois é frequente encontrar também ensaios seus em jornais e revistas de referência. Actualmente Zizek vive entre Buenos Aires, Ljubjana e Nova Iorque, lecciona em universidades norte-americanas e europeias. É vivo, especulativo, provocador, sagaz, e está quase sempre em trânsito. É omnipresente nos grandes centros de discussão e move-se com grande facilidade tanto nos meios académicos, como mediáticos, apesar do seu inglês expressivo macarrónico e ‘sioso’. Se um grande atractivo da sua vida e dos seus livros, se baseia nas suas opiniões sobre os mais diversos temas da actualidade, pela sua descontração, capacidade de comunicação e o prazer de entrar nos momentos de intimidade e quotidiano, em The Pervert's Guide to Cinema o conteúdo é complementado pelo valor das formas e das ideias que cruzam o cinema e a psicánalise. Por isso é um grande guia e um lição de cinema para todos. O documentário é realizado por Sophie Fiennes (irmã de Ralph e Joseph) -— a música incidental está a cargo de Brian Eno — dura quase três horas. Está estruturada em três partes: a primeira, está dedicada a Os Pássaros e a Vertigo- A Mulher Que Viveu Duas Vezes de Alfred Hitchcock, e é sobre a diferença entre a realidade e os desejos; a segunda, é sobre o libido e a terceira é sobre a eficiência das aparências, centrada pprincipalmente na obra de Tarkovsky e Bergman. The Pervert’s Guide to Cinema, prende-nos a atenção pela simplicidade das explicações, embora Slavoj não seja propriamente uma pessoa fácil de seguir no discurso, exactamente pela energia e gestualidade que pôe nos seus diálogos, mesmo apesar da clareza das suas ideias: a propósito de Mullholland Drive, de Lynch fala em frente da cortina vermelha e do microfone de época, onde “cantava” a gloriosa Rebekah del Rio; refere-se ainda O Vigilante, de Francis Ford Copolla e fá-lo no hotel do assassínio ou sobre O Exorcista, no mesmo quarto onde vomita Regan. Sobre Psico, de Hitchcock, vemo-lo sentado na cave da casa de Norman Bates explicando que cada um dos três niveis da casa representam as distintas partes do inconsciente freudiano (id, ego e super ego). E continua mostrando um fragmento de O Grandes Aldrabões, com os Irmãos Marx: é habitual encontrármos referências à psicoanálise corporizadas nas relacões entre pessoas. Por exemplo, os três irmão Marx: Groucho, Chico e Harpo. É claro que Groucho, é o mais popular, pela sua hiperactividade nervosa, é o super ego. Chico, é sempre o tipo racional, egoista, calculista, e é o ego. E o mais estranho dos três, Harpo, o mudo, que não fala -— Freud dizia que os impulsos são silenciosos — por isso é o id. O id em toda a sua ambiguidade radical. Principalmente, o que é estranho na personagem Harpo é que ele é infantilmente inocente, só persegue o prazer, brinca com as crianças e às vezes parece possuído por uma espécie de demónio primordial, pois torna-se agressivo. É esta combinação única entre corrupção total e a inocência que representa o id. Há ainda uma cena marcante no documentário que está de alguma forma ainda relacionado com um dos seus livros: Bem-Vindo ao Deserto do Real e com o filme Matrix dos Irmãos Wachowski. Num excerto de Matrix, vê-se Morfeo a oferecer duas pílulas a um Neo atónito enquanto, o primeiro lhe explica o significado de cada uma. Sentado no mesmo cadeirão onde no excerto Neo mirava atónito - e, curiosamente, com o mesmo cenário em fundo – é Zizek que encara Morfeo dizendo-lhe e a nós, espectadores, o significado das duas pílulas: A escolha entre as duas pílulas, a azul e a vermelha não é realmente uma escolha entre a ilusão e a realidade. Partindo do princípio de que Matrix é uma máquina de ficcões, mas essas são ficcões que já estruturam a nossa realidade: se nos tiram a nossa realidade essas ficcões simbólicas que a regulam, também perderemos a realidade em si mesma. No caso de existir uma terceira pastilha, então que significa essa terceira pílula. Definitivamente não é de todo um tipo de pílula trascendental que permite uma 'falsa experiência religiosa fast food', mas antes uma pastilha que permite perceber não a realidade por detrás da ilusão mas antes a realidade dentro da própria ilusão.
O pensamento de Zizek , ultrapassa claramente a filosofia, a psicanálise, a sociologia e a política. Foi curiosamente candidato à presidência da Eslovénia nas eleiçõe de 1990. É um homem de posições claras e não tolera os relativismos pós-modernos. O seu projecto teórico como diz no documentário, faz coincidir a pulsão de morte freudiana e o idealismo alemão. Como todos os grandes filosofos considera-se um discípulo, principalmente de Lacan e é um revitalizador da obra de Freud que não se resume apenas como ele próprio diz à sexualidade.

José Vieira Mendes




Lista dos títulos (em inglês tirada do site) dos filmes abordados:

Possessed (1934)
Clarence Brown

The Matrix (1999)
Andy and Larry Wachowski

The Birds (1963)
Alfred Hitchcock

Psycho (1960)
Alfred Hitchcock

Duck Soup(1933)
Leo Mc Carey

Monkey Business(1931)
Norman Z McCleod

The Exorcist(1973)
William Friedkin

Testament of Dr Mabuse(1933)
Fritz Lang

Alien(1979)
Ridley Scott

The Great Dictator(1940)
Charles Chaplin

Mulholland Drive(2002)
David Lynch

Alice in Wonderland(1951)
Clyde Geronimi, Wilfred Jackson and Hamilton Luske

The Red Shoes(1948)
Michael Powell

Dr. Strangelove(1963)
Stanley Kubrick

Fight Club(1999)
David Fincher

Dead of Night(1945)
Alberto Cavalcanti

The Conversation(1974)
Francis Ford Coppola

Blue Velvet(1986)
David Lynch

Vertigo(1958)
Alfred Hitchcock

Psycho Theatrical Trailer(1960)

Solaris(1972)
Andrei Tarkovsky

The Piano Teacher(2001)
Michael Haneke

Wild at Heart(1990)
David Lynch

Lost Highway(1996)
David Lynch

Dune(1984)
David Lynch

Persona(1966)
Ingmar Bergman

Eyes Wide Shut(1999)
Stanley Kubrick

Blue(1993)
Krysztof Kieslowski

In the Cut(2003)
Jane Campion

The Wizard of Oz(1939)
Victor Fleming

Frankenstein(1931)
James Whale

10 Commandments(1956)
Cecil B. DeMille

Dogville(2003)
Lars Von Trier

Alien Resurrection(1997)
Jean-Pierre Jeunet

To Catch a Thief(1954)
Alfred Hitchcock

Saboteur(1942)
Alfred Hitchcock

Rear Window(1954)
Alfred Hitchcock

North by Northwest(1959)
Alfred Hitchcock

Stalker(1979)
Andrei Tarkovsky

Kubanskie Kasaki(1949)
Ivan Pyryev

Ivan the Terrible (Part Two)(1945)
Sergei Eisenstein

Pluto's Judgment Day(1935)
David Hand

City Lights(1931)
Charles Chaplin


Lista das obras de Slavoj Zizek, editadas em Portugal, pela Relágio de Água:

- Bem-Vindo ao Deserto do Real
- A Marioneta e o Anão – O Cristianismo entre Perversão e Subversão
- A Subjectividade por Vir – Ensaios Críticos sobre a Voz Obscena
- Elogio da Tolerância
- As Metástases do Gozo – Seis Ensaios sobre a Mulher e a Causalidade

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Um guia psicanalitico da história do cinema sem um filme de Woody Allen? Hum... não deixa de ser irónico. Parece-me que o Sr. Alvy Singer não deve ter ficado mt contente...

O documentário passou-me ao lado mas, pela descrição feita, terá sido a primeira e ultima vez.

25 de abril de 2007 às 13:41  

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