20 ANOS DA MORTE DE ANDREI TARKOWSKY (1932-1986)

6 NO EXILIO: DE ‘NOSTALGIA’ A ‘O SACRIFÍCIO’
Em Nostalgia (Nostalghia, 1983), o realizador trata do regresso de uma grande figura da cultura russa, acompanhando a viagem do poeta Andrei Gorchakov, que vai à Itália com o objectivo de recolher material sobre a vida do músico Sosnovsky. Acompanhado por Eugénia, a sua guia italiana, o protagonista conhece Domenico, um morador local que todos consideram um louco, pois, no passado, fechou-se com a família dentro de casa por vários anos, esperando pelo fim do mundo. Gorchakov e Domenico são muito diferentes, mas ambos sentem-se incompreendidos e vivem num isolamento que cresce a cada momento. O primeiro é acometido de um profundo sentimento de saudade da sua casa, da terra natal e dos seus entes queridos; o segundo entende que a sociedade tomou um rumo equivocado e que, para corrigi-lo, seria necessário recomeçar do zero. Um e outro acabam por materializar as suas ideias e a sua fé de forma absolutamente arrebatadora: Domenico declamando fervorosamente para as silenciosas estátuas na praça, enquanto Gorchakov cumpre sua promessa de atravessar a piscina de Santa Catarina com a pequena vela acesa. Este filme foi o primeiro realizado por Tarkovsky fora do seu país e talvez seja justamente por isso que o sentimento de nostalgia se evidencia nele de forma tão incisiva. Depois de concluído o filme, Tarkovsky e a mulher, que sempre demonstraram uma certa oposição ao regime, decidem desertar e nunca mais voltaram à URSS, apesar do cineasta passar o resto de seus dias tentando persuadir as autoridades soviéticas a permitir que seu pai e seu filho viessem ao seu encontro.
O último trabalho do realizador foi O Sacrifício (Offret - Sacrificatio, 1986). Filmado na Suécia e pouco tempo antes de sua morte, por cancro, ganhou quatro prêmios no Festival de Cannes e conta com a participação de colaboradores habituais de Ingmar Bergman, um dos cineastas que Tarkowsky sempre admirou. Alexander (Erland Josephson), um actor retirado dos palcos, sente-se preocupado com a perda de espiritualidade no mundo, mas apesar disso a sua família e amigos reúnem-se para festejar o seu aniversário. A aparente melancolia do grupo transforma-se num incontido desespero quando rebenta uma guerra nuclear entre as potências globais. Face à iminente possibilidade de aniquilação, o protagonista toma a única atitude capaz de salvar aqueles que ama: visitar a estranhíssima Maria, que seu amigo carteiro jura ser uma feiticeira. Com uma fotografia fantástica e discutindo temas invariavelmente fundamentais ainda para o mundo de hoje, o filme é uma verdadeira elegia da fé e da incrível força de que dispõe o homem comum para lutar contra a predeterminação e estabelecer um destino próprio, tanto para si quanto para seus semelhantes.
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